terça-feira, 15 de junho de 2010

Bram Stoker

As luzes já haviam se acendido, mas mesmo assim a rua estava escura. E além de escura, estava silenciosa e deserta, fazendo com que o som de cada passo parecesse amplificado. Engraçado como tudo sempre fica escuro e morbidamente quieto depois que a noite se instala.
Lucy estava apressada, queria chegar em casa logo. Acabara se atrasando no trabalho e precisou ligar para a babá, pedindo que ela esperasse mais alguns minutos antes de sair. Pobre Anne, passava o dia todo com a babá, enquanto a mãe trabalhava no escritório do sr. Morrinson. Ás vezes Lucy pensava que a filha estava crescendo depressa, mas ela não estava lá para observar.
Se o pai de Anne tivesse se importado, tudo seria diferente. Os 200 dólares que mandava no fim do mes mal pagavam a babá. Lucy tinha de ser mãe, pai e ainda mentora financeira da casa. Entre cuidar do trabalho e do lar, acabava sem tempo para a filhinha. Acabava sem tempo para ela mesma.
Ajeitou os braços mais próximos do corpo para se proteger do vento frio. A visão periférica detectou uma espécie de movimento, e Lucy notou alguém do outro lado da rua. Não deu importância. Passou a lembrar dos tempos da faculdade, onde era jovem e bela, e as coisas pareciam maravilhosas. Lucy era loira, de rosto simétrico, com uma incrivel beleza para uma mulher na casa dos 28 anos. Mas não se comparava aos tempos de quando fora a garota mais irresistível do campus. Era extremamente bonita e usava isso a seu favor. Então veio Anne...
Lucy balançou a cabeça. Não podia pensar isso, não podia atribuir culpa nenhuma à sua criança. Ouviu passos ligeiramente atrás dela, e virou a cabeça para ver quem era. A pessoa que estava do outro lado da rua havia atravessado. Lucy percebeu que era um sujeito de cabelos bagunçados, extramamente claros, beirando o branco. Parecia ter cerca de 1,80, de corpo esbelto e ombros largos. Vestia um sobretudo preto, e um cachecol também preto dançava ao vento. Olhando melhor, percebeu que toda a vestimenta era preta. Mas o que mais chamava a atenção eram seus olhos: de um azul muito intenso, fitavam diretamente os olhos de Lucy. Pareciam perigosos, e, ao mesmo tempo, irresistíveis.
Lucy voltou o rosto para a frente, tentando entender o que havia de tão estranho com aqueles olhos, quando ouviu uma voz fria, porém amistosa:
- Normalmente recomendam às donzelas que não andem sozinhas depois do anoitecer.
Lucy virou-se, rindo de nervosismo, e respondeu:
- Eu sei.
- Frio, não? - perguntou o homem, descontraído - Particularmente, eu adoro temperaturas baixas, mas a maioria das pessoas...
- Perdão - interrompeu Lucy -, mas eu estou com pressa.
Dizendo isso, tornou a virar-se. Então, teve um misto de horror e surpresa. O homem estava bem na sua frente. Notando o espanto que se formava no rosto de Lucy, falou:
- Nós dois estamos andando na mesma direção. Não seria pedir demais desfrutar de sua companhia por alguns metros de caminhada, seria?
Desconcertada, Lucy concordou. Realmente, não seria incômodo nenhum ser acompanhada por um belo homem até em casa. Porém, a cada passo este estranho se tornava mais enigmático. Conseguia ser tão assustador como sedutor, o que não dava muita segurança.
- Me chamo Victor - disse ele. - E a senhorita?
- Lucy - respondeu ela, olhando cautelosamente para os olhos de Victor. Malditos olhos, aqueles.

* Esse texto foi escrito com a intenção de ser públicado em outro projeto meu, mas resolvi adiantá-lo neste blog, com um título provisório, uma alusão ao conteúdo central da obra.

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