quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Do meu jeito

Olhares de desaprovação são tão casuais como respirar. É estranho, te olharem desse jeito, com repulsa; o modo com que fixam o olhar em você, compressando a pupila e tendo como acompanhamento um par de lábios cerrados parece revelar cada palavra desgostosa que se passa pela cabeça alheia.
E, é estranho, porque na prática você não deu motivo nenhum a pessoa nenhuma que possa traduzir tanto ódio aparente. A não ser, é claro, que você atingiu em cheio uma das maiores fortalezas da sociedade humana, e, a meu ver, a mais inconveniente delas: a normalidade.
Ninguém tem o direito de censurar meu jeito de me vestir, meu jeito de cortar o cabelo, o que eu passo no meu olho e o tamanho das argolas que uso na orelha, e essa é a parte divertida. É divetido ver todos olhando torto porque você está fora dos padrões. É realmente divertido causar essa "poluição visual". Tantas vezes me disseram que é horrível, vergonhoso, homossexual e que não entendem porque eu faço isso. Mas é que ele me disse que eu fico lindo. O meu coração.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Twilight

O já esperado silêncio o qual custara a se acostumar. Uma melodia fúnebre não seria tão plausível ao momento quanto o maldito silêncio era. Nem o ouvido mais treinado poderia ouvir um ruído se quer. E essa falta de sons fundia-se perfeitamente com a ausência de luz, criando a mais pura sensação de solidão.
Mas era por esse silêncio que fazia o que devia ser feito. Não era mais uma questão de sobrevivência, já não sabia o que era sobreviver a muito tempo. Era uma questão de desejo, sempre foi. Os últimos vestígios de seu pecado escorriam pelos lábios, o que dava a sensação de que havia se esbaldado em um nectar proíbido. Já não havia mais nada na fonte, acabara de virar um compulsivo. Mas, nada mais se passava em sua cabeça após a sua droga tocar sua boca e entrar em contato com o seu organismo. Tudo ao seu redor se evaporava, e a sensação de euforia era tremenda para ser descrita. Não sentia dores. Pra falar a verdade, não sentia nada. Era mais potente do que mil orgasmos, era o maior prazer que conhecia. Era a única coisa que fazia valer a pena sua ridícula existência.
O escuro e o silêncio acasalavam-se em tão perfeita harmonia, que escondiam o crime hediondo ocorrido no local. Apenas mais um corpo sem vida, em uma rua qualquer. Apenas mais uma vítima, como qualquer outra. Apenas mais uma forma de se manter o vício, que já durava algumas centenas de anos, e que apenas aumentava. Sabia que precisava de mais sangue, para evitar as dores da abstinência.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Dia dos Pais

Do tanto de vezes que eu reclamo por me esforçar sem reconhecerem, pode parecer até tento ser um mártir. Muito obrigado, eu passo. Venho mergulhado em um drama familiar a uns 4 ou 5 anos, e por mais que ele possa parecer ter desaparecido, ele apenas melhora nuns dias e piora - ou melhor, volta ao normal - nos outros.
Um senhor de quase 60 anos, depressivo, que mora sozinho em uma casa pobre, e que ainda não venceu os traumas de um passado recente. Tem varizes, já fez diversas cirurgias, e o problema nunca se resolve. Tem dois filhos, um com síndrome de asperguer, que desde pequeno foi responsabilidade do filho maior. Filho maior, este, que tenta, pelo menos uma vez por semana, caminhar 15 ou 20 minutos pra ver como o pai está. Filho este, que a única coisa que ganha do pai são malditos 50 reais destinados à mensalidade da sua aula de violão. A pensão foi adiantada à ex-mulher, que passa por constantes crises financeiras. Mulher essa que é a culpada de toda a desgraça na sua vida. Pois se não fosse essa mulher, ele não estaria na situação em que está, não estaria sofrendo como um cachorro, jogado no mundo. Se não fosse ela, não teria essa desculpa que eu tenho que ouvir pelo menos uma vez por mês nos últimos 4 anos.
Quando eu era menor, via os filmes americanos nos quais existe uma família perfeita, onde o pai brinca com os filhos, joga futebol com eles, vai torcer por eles nas competições, sai pra passear, dentre outras atividades de realacionamento entre pais e filhos. O melhor relacionamento que eu tive com o meu pai foi passar 2 dias na casa antiga dele, ir com ele pra cidade vizinha comprar minha guitarra (sim, foi ele quem me deu) e almoçar com ele no Natal. Se você somar, talvez eu tenha ganho uns 3 mil reais dele, desde a separação. Mas amor, carinho, compreensão... Isso eu nunca recebi do meu pai. Ele nunca foi me ver jogar futsal, quando eu tinha meus 10 anos. Ele nunca me viu tocando, em nenhum lugar. Ele nunca admitiu eu gostar de um som musical que ele não suporta. Ele nunca pediu o que eu queria ser quando crescer, só sugeriu que eu fosse advogado.
Ele nem faz ideia das coisas que eu escrevo, das coisas que eu canto, da maldita facilidade que eu tinha quando fazia teatro, que tanto elogiaram. Mas, meu pai... Ele nunca, nunca me disse "filho, eu tenho orgulho de você, você foi muito bem".
Costumo dizer que eu só pedi pra Deus uma família, e eu acho que ele me deu uma que tinham devolvido, com defeito. Mas, graças a Ele, eu ganhei um pai que me serve de exemplo, exemplo daquilo que eu nunca quero ser. E, tendo apenas coisas pra reclamar, eu tenho medo de estar virando exatamente o que ele é. Pelo menos nos próxmos dias, eu não quero vê-lo nunca mais.